segunda-feira, 15 de outubro de 2007

"só tenho vontade de escrever num estado explosivo, na excitação ou na crispação, num estupor transformado em frenesi, num clima de ajuste de contas em que as invectivas substituem as bofetadas e os golpes. Em geral, começa assim: um ligeiro tremor que se torna cada vez mais forte, como depois de um insulto que se recebeu sem responder. Expressão equivale à réplica tardia ou à agressão adiada. Escrevo para não passar ao ato, para evitar uma crise. A expressão é alívio, desforra indireta daquele que não consegue digerir uma vergonha e que se revolta em palavras contra os seus semelhantes e contra si mesmo. A indignação é menos um gesto moral que literário, é mesmo a mola da inspiração. E a sabedoria? É justamente o oposto. O sábio em nós arruína todos os nossos élans, é o sabotador que nos enfraquece e nos paralisa, que espreita em nós o louco para dominá-lo e comprometê-lo, para desonrá-lo. A inspiração? Um desequilíbrio súbito, volúpia inominável de se afirmar ou de se destruir. Não escrevi uma única linha na minha temperatura normal. E, no entanto, durante muitos anos, me julguei o único indivíduo livre de taras. Esse orgulho me foi benéfico: me permitiu escrever. Parei praticamente de produzir quando, apaziguado o meu delírio, me tornei vítima de uma modéstia perniciosa e funesta para esta exaltação de que emanam as intuições e as verdades. Só consigo produzir quando, tendo desaparecido subitamente o sentido do ridículo, me considero o começo e o fim."

tenho me apaixonado cada vez mais por Emil Cioran - e cada vez menos por inúmeros outros "seres".

Nenhum comentário:

eXTReMe Tracker